ARTIGO TÉCNICO
ESTUDO DA INCORPORAÇÃO DE RESÍDUOS DE ROCHA NA FABRICAÇÃO DE BLOCOS CERÂMICOS E TELHAS
Trabalho apresentado no 59º Congresso Brasileiro de Cerâmica, 17 a 20 de maio de 2015, Barra dos Coqueiros, Aracaju (SE)
Resumo
Cachoeiro de Itapemirim (ES) possui lugar de destaque na produção de rochas ornamentais. No entanto, o processo de fabricação gera quantidades enormes de resíduos, que causam enormes problemas ambientais caso sejam descartados diretamente na natureza. Este trabalho tem por objetivo a caracterização e incorporação desse resíduo na fabricação de blocos cerâmicos e telhas. Para caracterização dos materiais, foram realizados os ensaios de granulometria, análise química e densidade real dos grãos. Após a caracterização, foram moldados os corpos de prova pelo processo de extrusão e posterior queima a temperatura de 900°C. Foram utilizadas diferentes incorporações para cada solo utilizado. Para verificação da viabilidade do uso do resíduo, foram realizados os ensaios de absorção de água, retração linear e resistência à flexão a três pontos. Os resultados obtidos indicaram a incorporação de 5% de resíduo na produção de telha e contra indicou o uso do resíduo na produção de blocos cerâmicos.
Introdução
O município de Cachoeiro do Itapemirim, localizado ao sul do Espírito Santo, é um dos maiores produtores de rochas ornamentais do Brasil, com aproximadamente 600 empresas. O corte e os polimentos realizados por essas empresas geram resíduos em forma de pó, e em geral, são grandes poluentes, causando sérios impactos ambientais na região.
O processo de produção dessas rochas ornamentais produz cerca de 800.000 toneladas por ano de resíduo nos estados do Espírito Santo, Minas Gerais, Bahia e Ceará. Grande parte destes detritos são despejados no ambiente sem prévio tratamento, assim, o setor industrial vem sendo penalizado por ambientalistas pelos danos causados ao ecossistema da região.
Uma alternativa para diminuir o impacto causado por este resíduo é a sua incorporação em segmentos da construção civil, como por exemplo, peças cerâmicas.
O município de Campos dos Goytacazes-RJ, a 126 km de Cachoeiro, possui uma enorme reserva de argila, que incentivou o desenvolvimento do forte mercado de cerâmica vermelha na região. A incorporação do resíduo de rocha na fabricação de blocos cerâmicos e telhas seria uma alternativa viável, tanto para as empresas de rochas ornamentais que encontrariam destino para seu resíduo, quanto para as produtoras de blocos cerâmicos caso o resíduo melhore as propriedades do material.
O objetivo deste trabalho é caracterizar as argilas utilizadas para produção de blocos cerâmicos e telhas cerâmicas e do resíduo de rocha ornamental. Após a caracterização, serão realizados ensaios para verificar a viabilidade de incorporação do resíduo nos teores de 5%, 10%, 15%, além da referência sem adição de resíduo em cada argila.
Materiais e métodos
Neste capítulo são apresentados os materiais utilizados e o programa experimental do presente artigo.
As argilas utilizadas no trabalho foram coletadas de uma cerâmica onde as mesmas já são utilizadas para produção de blocos cerâmicos e telhas no município de Campos dos Goytacazes-RJ. Foram coleta- das quantidades de 15 kg para cada argila, onde as mesmas já se encontravam fora do seu estado natural (ou seja, não foram es- cavadas) empilhadas em montes nas cerâmicas.
O resíduo utilizado no trabalho foi coleta- do em Cachoeiro de Itapemirim-ES de uma serralheria que utiliza fio de ferro no corte de pedras ornamentais. Foram coletados 20 kg de resíduo já que o mesmo é armazenado com grande umidade, em forma de lama, portanto haveria uma grande diminuição da massa do resíduo após a secagem.
A caracterização dos materiais foi dividida em duas partes: caracterização física e mineralógica. A caracterização física englobou os ensaios de análise granulométrica, limites de Atterberg e densidade real dos grãos. Já para caracterização mineralógica foi feito o ensaio de Análise química. Todos os ensaios foram realizados para ambas as argilas e o resíduo, com exceção dos limites de Atterberg que não é possível ser realizado para o resíduo.
A análise granulométrica foi realizada de acordo com a norma ABNT NBR 7181 (1984). Até a peneira ABNT n° 200 (0,074mm), as amostras foram classificadas por peneiramento. Abaixo deste diâmetro foi utilizada a técnica de sedimentação. No ensaio de sedimentação foi utilizada a substância hexametafosfato de sódio como defloculante. A classificação do solo foi feita de acordo com Casagrande (1942) - Unified Soil Classification . Classificação que é utilizada pelo U.S. Bureau of Reclamation (barragens) e U.S. Army Corps of Engineers (aeroportos).
Para realização dos ensaios de Limite de Liquidez (LL) e Limite de Plasticidade (LP), as argilas foram primeiramente destorroadas e passadas na peneira (ABNT) n°40 (0,42mm). O ensaio de Limite de Liquidez foi feito conforme a ABNT 6459 (1984), para isso utilizou-se o aparelho de Casagrande. Para o limite de plasticidade, foi utilizada uma placa esmerilhada e realizado de acordo com a ABNT NBR 7180 (1984).
No ensaio que determina a densidade real dos grãos, foi utilizado o picnômetro e o ensaio segue as recomendações das respectivas normas: ABNT NBR 6508 (1984) e ABNT NBR 6457 (1986).
A caracterização mineralógica compreende o ensaio de composição química. O ensaio de composição química fornece a composição do material analisado em torno de seus elementos constituintes e quantidades. Sua composição foi determinada através da Espectroscopia de Energia Dispersiva de Raios X (EDX), em um equipamento da Shimadzu EDX-700.
Resultados e discussão
O presente capítulo tem como objetivo mostrar todos os resultados apurados nos ensaios realizados em laboratório durante toda pesquisa.
A distribuição granulométrica da argila utilizada em telhas apresenta 59,8% de argila e 32,7% de sílte, o que representa um total de 92,5% do solo apenas nessas duas faixas granulométricas. A argila utilizada em blocos cerâmicos apresenta 64,4% de argila e 28,4% de sílte, o que representa um total de 92,8% apenas nessas duas faixas granulométricas. Já o resíduo de fio de ferro apresenta apenas 17,7% de argila enquanto o sílte tem 77,3%, totalizando 95,0% do solo apenas nessas duas faixas. Os resultados para a densidade real dos grãos e os índices de Atterberg encontrados neste artigo e por PEDROTI (2007), XAVIER (2001) e ALMEIDA (2012) para os solos pesquisados por eles na baixada campista são apresentados na tabela 3.2.
A tabela 3 apresenta os resultados para a análise quantitativa dos elementos químicos encontrados nos solos estudados nesta pesquisa.
Os resultados para o óxido de silício (Si2) em torno de 50% pode ser um forte indicativo de presença de sílica livre e de argilominerais como a caulinita (AI2O3, 2SiO2, 2H2O) que tem sido verificada por diversos pesquisadores (XAVIER, 2001; ALEXANDRE, 2000; PEDROTI, 2007) da região,
Para a verificação da viabilidade da incorporação do resíduo de fio de ferro, foram testadas três incorporações, 5%, 10%, 15%, além da referência com 0%, para ambas as argilas utilizadas para a fabricação de blocos cerâmicos e telhas em olarias da região Norte Fluminense.
Observou-se que a incorporação de 5% obteve o melhor resultado na argila para fabricação de telhas, já que os corpos de prova sofreram a menor variação linear conforme observado no gráfico da figura 1. Já para a produção de blocos cerâmicos todas as incorporações indicaram uma piora das propriedades, aumentando a variação linear.
O gráfico da figura 5 indica os valores obtidos nos ensaios de resistência à tração na flexão dos corpos de prova. Como pode ser observado no gráfico, a incorporação de 5% apresentou a melhor resistência à flexão. Vale destacar também o desempenho obtido pela incorporação de 15% onde foi obtido resistência superior ao teor referência.
Para a produção de blocos cerâmicos os resultados confirmam o que foi obtido nos ensaios anteriores, nenhuma das incorporações apresentam melhora nas propriedades.
A partir do gráfico apresentado da figura 3, o maior valor de massa específica aparente foi obtido pela incorporação de 5%. Já para a produção dos blocos cerâmicos nenhuma das incorporações apresentou melhora na massa específica, conforme já seria previsto, visto que em geral, quanto maior a porosidade aparente, menor será a massa específica aparente.
Como pode ser observado no gráfico da figura 4, a menor absorção de água foi obtida pela incorporação de 5% para a fabricação de telhas. A Associação Brasileira de Normas Técnicas com sua norma, ABNT NBR 15270-1 (2005), traz a recomendação de que os valores de absorção de água não sejam superiores a 20% na fabricação de telhas, assim, a incorporação de 15% é a que mais se aproxima deste valor, no entanto, os valores obtidos ainda estão distantes do que exige a norma.
Para a fabricação de blocos cerâmicos todas as incorporações testadas obtiveram um aumento na absorção de água.
A partir do gráfico apresentado na figura 2 conclui-se que novamente a incorporação de 5% possui o menor índice de porosidade aparente, sendo o melhor resultado obtido nas incorporações testadas para a produção de telhas cerâmicas. Para a produção de blocos cerâmicos, nenhuma das incorporações apresentou diminuição da porosidade.
Conclusão
Este trabalho teve como principal objetivo definir a melhor incorporação de resíduo de fio de ferro na argila para fabricação de blocos cerâmicos e telhas cerâmicas.
A argila utilizada para fabricação de telhas apresentou valores elevados de limite de liquidez e índice de plasticidade, se comparados com a de outros autores que utilizaram argilas do mesmo município, enquanto a argila utilizada para fabricação de blocos cerâmicos apresentou um ligeiro aumento em relação aos mesmos autores.
A densidade real dos grãos da argila utilizada para fabricação de blocos cerâmicos apresenta valores abaixo da média obtidas por outros autores, onde também se encontra a argila utilizada para fabricação de telhas.
O resíduo utilizado no trabalho apresentou na análise granulométrica valores compatíveis com ao das argilas utilizadas, no entanto, no resíduo existe a predominância da fração granulométrica sílte, enquanto nas argilas existe a predominância da fração granulométrica argila.
Após todos os ensaios realizados, pode-se concluir que a incorporação de 5% se destacou em todos os ensaios, demonstrando ser a incorporação ideal a ser utilizada para a fabricação das telhas cerâmicas.
Pode-se concluir também que não é recomendada a incorporação do mesmo resíduo na fabricação de blocos cerâmicos com a argila atualmente utilizada, visto que em nenhum dos ensaios realizados a incorporação de resíduo mostrou evolução nas propriedades.
Os resultados obtidos também indicam a viabilidade da incorporação de resíduo, que atualmente não tem destino, transformando-o em um importante material para melhorar a propriedades das telhas cerâmicas produzidas no município de Campos dos Goytacazes.
Fonte: Revista NovaCer